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quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Frida Kahlo - A Coluna Partida, 1944


“Pinto a minha própria realidade”

Em 1907 nasce em Coyoacán, Frida Kahlo, mulher inconfundível no universo artístico mexicano do século XX.
O seu estilo artístico, que muitos quiseram encaixar no surrealismo, é inspirado na arte popular do seu país e nas suas experiências dolorosas. A propósito dizia: “Nunca pintei sonhos. Pintei a minha própria realidade”.
Os traços índios, herança genética da família da mãe, vão ser representados continuamente, sobretudo nos auto-retratos. Mais de metade dos quadros de Frida são auto-retratos. É neste sentido que ela diz: “eu pinto-me porque estou muitas vezes sozinha e porque sou o tema que conheço melhor. Nos auto-retratos, Frida surge com fartas e unidas sobrancelhas negras e um exagerado buço, ornamentada com grossos colares de pedras e brincos artesanais.
Apesar da pintora não se identificar com o surrealismo muitas das suas obras tocam ao de leve neste movimento artístico. A magia, o sonho, a simbologia, são visíveis em muitos dos seus quadros.
Há uma obra artística de Frida que me enche de comoção quando a observo – A Coluna Partida. A vida de Frida foi marcada pelo sofrimento físico, consequência de um acidente na juventude quando regressava da escola. Ficou gravemente ferida na coluna e no abdómen. Sobreviveu mas com sequelas para toda a vida. Ela própria dizia que os ferros do autocarro a trespassaram, a violaram. A obra A Coluna Partida “representa a sua própria realidade”. Na altura em que pintou este auto-retrato a sua saúde estava fragilizada sendo aconselhada a usar coletes ortopédicos para fortalecer a coluna. O quadro descreve Frida com a cabeça erguida em sinal de determinação e coragem em aguentar o sofrimento. Dos olhos chovem grossas gotas de lágrimas que se derramam no ousado buço e nos lábios melancólicos. O corpo coberto de espinhos simboliza o martírio comparável ao de S. Sebastião, jovem mártir europeu. O que mais impressiona o meu olhar, é o corpo rasgado e fendido, suportado por uma coluna jónica, também ela partida em vários sítios, simbolizando a coluna fracturada de Frida. O capitel da coluna eleva o queixo, revelando um rosto capaz de suportar a dor física. O colete de aço aperta-lhe a coluna e o peito prolongando-se numa saia vaporosa apenas cravejada nalguns pontos, sinal evidente que Frida acredita na recuperação.
A paisagem desértica que envolve o auto-retrato é o prolongamento do sofrimento, também ela está marcada por profundas fendas como o corpo de Frida.
O quadro revela claramente a dor física e espiritual própria do ser humano mas revela também a vontade e a força que subjaz de escapar a essa dor.

Isabel Laranjeira