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domingo, 11 de julho de 2010

DIA EM VÃO


A janela está fechada. Subi para me deitar cedo e não tenho sono.
Não falei com ninguém desde há dez dias, excepto uma vez ao homem do cigarro. A noite está extremamente silenciosa. Por toda a parte, à volta do quarto, o vento, o ruído do mar, passos no corredor, latidos de cães, em baixo. No quarto, um silêncio muito denso e no meio o meu coração que bate. Resta-me o meu coração que bate sempre, sempre. Junto do mar, em pleno dia, é diferente. Está-se nas mãos do mar. Sente-se esse prazer de o respirar. Numa ordem que não sente, é-se esse nada de desordem que sente. Uma coisa a constatar o mar. Saboreia-se então com sofreguidão o barulho do coração que bate. No momento em que ele poderia não... Que bate em vão. Ou por um motivo que hoje não tem. Que bate em vão. Porque, de cada vez, hoje é um dia em vão, que não terá outro igual. Está-se em férias de si mesmo ao esperar em vão. Nesse caso vive-se para o prazer; está-se presente nesse presente; as pernas não podem conter-se mais, elas querem mexer-se e estão sufocadas de riso.

Vida Tranquila, Marguerite Duras, DIFEL, 1989

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