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sexta-feira, 25 de abril de 2008

OPINIÃO

SOLIDARIEDADE À DISTÂNCIA

Intriga-me esta solidariedade à distância tão típica do nosso tempo, quando o materialismo e o egoísmo parecem ser as notas dominantes. É tão cómodo pagar e não ter que me aborrecer com o que não gosto. Eis, que em qualquer lugar surge a feliz oportunidade de ser solidário e a sensação instantânea do dever cumprido. É a Corrida da Mulher, a Corrida do Homem, o brinquedo que te impingem à porta dos Hipermercados para uma qualquer causa/instituição, o saco para o Banco Alimentar Contra a Fome, o peditório da Liga Portuguesa Contra o Cancro, a venda da revista Cais, a Legião da Boa Vontade, a Abraço; para não falar da publicidade televisiva, principalmente na época natalícia, às inúmeras causas, a Missão Sorriso, a Causa Maior, a Casa do Gil, as Ceias de Natal, os concertos de Natal, etc.
Questiono-me sobre esta incrível abundância de generosidade tão fervilhante na sociedade actual, quando se ignora o colega de trabalho que precisa de uma qualquer ajuda, se desconhece o vizinho que mora há trinta anos a teu lado, se depositam os pais em lares de terceira idade, se ignora um parceiro de viagem que se sentiu mal num comboio apinhado de gente, se vira a cara ao sem abrigo que está na rua à tua frente…
A quantidade de lixo que estas actividades produzem impressiona quem se preocupa minimamente com o ambiente, assim como todo o aparato de propaganda comercial que as envolve.
Mas o problema central desta solidariedade contemporânea, é saber para onde vão estes donativos. Pergunto-me se chegarão ao fim pretendido ou se engrossam salários chorudos e armários de quem se aproveita da generosidade alheia mas não dá a sua. Os meios justificarão os fins? Uma solidariedade longínqua, sem rosto, compensará o alheamento e a indiferença quotidiana?
Neste contexto parece enquadrar-se, como uma luva, o slogan da AMI – “Dê, vai ver que não dói nada.” Não, não dói, mas será que nos humaniza? É sem dúvida muito cómodo.
Se é verdade que os filósofos nunca se acomodaram ao mundo, eu já me acomodei, mas note-se, não sou filósofa, simplesmente, às vezes, ainda me indigno.

Prof. Isabel Soares

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